quarta-feira, 27 de junho de 2007

ENTREVISTA COM TAREK AZIZ



Foto: TAREQ AZIZ
24 DE MAIO DE 2007 - 11h29

Americanos levam 2 anos para permitir dentadura a Tareq Aziz

Em uma entrevista concedida ao jornal al-Arab al-Youm de sua cela na prisão americana de Camp Cropper, obtida por meio do advogado jordaniano Issem al-Ghazaoui (membro da equipe que faz sua defesa), o ex-vice premiê e ministro das Relações Exteriores do Iraque, Tareq Aziz, declarou que os EUA vão se retirar do país e que os iraquianos voltarão a estar unidos como antes.
Além disso, denuncia as péssimas condições sanitárias que vive, com os americanos privando Aziz de remédios e médicos.
Por Lokman Iskender, para o Tunistri e Iraq Solidaridad.

Aziz viu a execução do ex-presidente Saddam Hussein, transmitida pela tevê, e diz que esse foi o ''momento mais difícil'' de sua vida.
Por outro lado, revela que começou a escrever suas memórias e que se for libertado, irá para a Jordânia e depois para a Itália.

O advogado jordaniano conta que na quarta-feira, 26 de março de 2007, manteve um encontro com Tareq Aziz e que enquanto o esperava, em um corredor da base americana, o viu chegar meio relaxado, com uma bolsa azul, acompanhado de um sentinela.
Aziz entrou com o advogado em uma sala, sentou e começou a falar de Saddam Hussein, com orgulho:
''Era meu comandante, me sinto orgulhoso de ter trabalhado com ele''. Disse também que lamentava profundamente te-lo visto martirizado, tanto ele como seus companheiros.
O advogado conta que, depois pedir por paz na alma do extinto Saddam Hussein, Aziz perguntou:
''Como reagiu o pessoal a respeito de meu testemunho no tribunal?''.
O advogado respondeu que ''todo mundo estava de acordo em reconhecer seu valor e sua audácia, e ninguém esperava menos de alguém como você''.
Se alegrou por ouvir essas palavras, em seguida disse ''militamos pelos povos árabes e fizemos o que estava ao nosso alcance''.
Aziz também falou de sua esperança que as pessoas tomem consciência de todas as conspirações que o Iraque teve de enfrentar, desde a guerra com o Irã até o assunto do Kuwait e a atual ocupação do país.
''São questões complicadas, as pessoas precisam conhecê-las para compreender que o que aconteceu era honroso, que nos foi imposto e que, com independência dos resultados, cumprimos com nosso dever'', completou Aziz.

Leia abaixo a entrevista completa:

Lokman Iskender: Citaram o senhor como testemunha no caso al-Anfal (A campanha militar contra os curdos). O que o senhor tem a ver com esse assunto?
Tareq Aziz: Como ministro de Relações Exteriores, não tive nada a ver com as ações militares ou com qualquer outro assunto interno.

L.I -Está preso há quatro anos. Esperava por isso?

AZIZ -Não, mas pela minha família aceito qualquer coisa, inclusive ficar aqui por 15 anos.

L.I - Está arrependido de ter se entregado aos americanos em troca da liberdade de sua família? [2]

AZIZ -De forma alguma!

L.I - Mas está detido há quatro anos sem a menor acusação.

AZIZ - Para mim, era prioritária a saída de minha família do Iraque.
Por outro lado, tinha muito poucas possibilidades de me ocultar no Iraque. Como diplomata sou muito conhecido e tinha a idéia de que era melhor me entregar aos americanos que ser detido por iraquianos.
Isso me dá a oportunidade de escrever a verdadeira história do homem Saddam, no Iraque e de suas Relações Exteriores deste os anos 1980 até os nossos dias.

L.I - No último 15 de março foi anunciado aqui no Iraque que se estudava seriamente abolir a pena de morte.

AZIZ - Sim! Agora que já fizeram o que queriam fazer, podem abolir a pena de morte! (rindo).

L.I - Já começou a escrever as suas memórias?

AZIZ - Sim.

L.I - Pode adiantar para a gente algum detalhe?

AZIZ - Mais adiante, mais adiante.

Os piores momentos

L.I -Qual foi o momento mais difícil que passou durante sua detenção?

AZIZ - Quando vi na televisão a execução do Presidente Saddam Hussein.

L.I - Outros momentos igualmente difíceis?

AZIZ - Sim, quando compareci como testemunha no processo. O presidente do tribunal era muito agressivo e isso me chateou muito. O lembrei que eu estava aprisionado e o perguntei: que mais poderia fazer? vai me enfiar atrás das grades?

L.I - Quem será a primeira personalidade que visitará ao sair da cadeia?

AZIZ - O rei Abdulá II, da Jordânia , e depois o presidente iemenita e o emir do Catar.

L.I - Qual é o chefe de Estado, árabe ou de outro país, cuja atitude lhe pareça boa em relação ao Iraque?

AZIZ - O rei Abdulá II. Sua atitude a respeito dos iraquianos é excelente. É quem se encarregou de minha família, filhos e neto, e trata muito bem aos iraquianos na Jordânia.
Nesse sentido é muito honorável também a atitude do presidente iemenita Ali Abdalá Salá, já que recebeu muitos iraquianos e deu oportunidades de trabalho a mais de 3 mil professores que corriam perigo de serem liqüidados se permanecessem no Iraque. Por outro lado, no Iemen existem muitas famílias de autoridades do Iraque e há pouco soube que minha esposa também está ali.

Pelo que se refere ao Ocidente, a posição espanhola favorável aos EUA era muito curiosa, tendo em vista as boas relações históricas entre nosso país e eles. O ex-presidente Aznar arrastou seu país à guerra no Iraque, mas o povo espanhol acordou, fez com que seu governo caísse e que retirasse suas tropas do Iraque.

(Durante essa parte da entrevista Tareq Aziz teve fortes ataques de tosse)

L.I - O senhor não está bem de saúde.

AZIZ - Os americanos não me asseguram bons cuidados sanitários e os medicamentos que me dão são simples tranqüilizantes. Tive que esperar dois anos para conseguir uma dentadura.

O futuro do Iraque

L.I - Na sua opinião, quem e quais são os verdadeiros inimigos do Iraque?

AZIZ - Os governos americano e britânico, mas não seus povos; além deles o Irã e alguns governos árabes que participaram de maneira direta na introdução dos americanos no Iraque, e os ajudaram.

Na atual França a classe política é muito jovem e eu não a conheço. Entretanto conheço Chirac, que me recebeu muito bem durante a minha última visita e inclusive uma vez quebrou o protocolo, me acompanhando em uma caminhada numa escalinata no Eliseu (N. da redação, escalinata é uma caminho longo em aclive com diversos patamares, muito utilizada no Império Romano).

O premiê Jospin me recebeu três vezes e me acompanhou até a escalinata de Matignon, rompendo também o protocolo. Tudo isso é testemunho de amizade e respeito ao Iraque. A postura da Rússia também é boa, tatno do atual ministro de Relações Exteriores como o representante nas Nações Unidas, são pessoas excelentes.

L.I - Tem alguma relação com o presidente americano George W. Bush?

AZIZ - Encontrei-me várias vezes com Bush pai, mas não com o filho. Em 1984 visitei a Casa Branca e nos encontramos em várias ocasiões, entre elas o enterro do presidente iugoslavo, Marechal Tito.

L.I - Com quem fala e passa o tempo agora que executaram seus companheiros de cela?

AZIZ - Passo o tempo com meus camaradas Akla al-Kebissi, um general, Latif al-Mahal, um ex-governador, e o professor Jamel, marido de Hella Saddam Hussein. Ele, por não ter lugar na sua cela e possuir vários exemplares repetidos de livros, me deu uma mala que tinha exemplares do alcorão, da bíblia e de vários outros livros de política e filosofia.

L.I - Qual é o futuro do Iraque depois de tudo o que aconteceu?

AZIZ - Estou convencido de que a coalizão (das forças de ocupação) será desfeita, de que os americanos vão se retirar. O povo iraquiano segue sendo um povo vivo, que repudia a injustiça. Estou convencido de que o Iraque voltará a se reunir. O povo iraquiano é um povo escolarizado e educado, e tudo isso conduzirá o país a um bom destino.

L.I - Qual é o papel atual do Vaticano na questão iraquiana?

AZIZ - Não conheço o atual papa e minha última visita ao Vaticano (quando encontrou-se com João Paulo II em fevereiro de 2003) foi na qualidade de ministro das Relações Exteriores do Iraque. Tinha boas relações, oficiais e pessoais, mas atualmente não conheço a nova política do Vaticano.

L.I - Onde pretenderia viver assim que sair do cárcere?

AZIZ - Ficaria um tempo na Jordânia com a minha família e depois iria para a Itália.

Notas do site IraqSolidaridad, onde essa entrevista foi publicada:

1. O Camp Cropper está situado no Aeroporto Internacional de Bagdá.
Os EUA mantém nesse centro de detenção os mais importantes dirigente do governo deposto do Iraque e da Resistência
2. Tareq Aziz entregou-se imediatamente após a tomada de Bagdá pelos americanos em 24 de abril de 2003, devido ao estado de saúde de sua esposa. Sua própria saúde havia deteriorado notavelmente durante os meses anteriores ao início da invasão. Tareq Aziz nasceu em 1936.
3. Veja no site IraqSolidaridad: Ahmed Yanabi: Entrevista com Badie Issat, advogado de Tareq Aziz: ''Foi detido há três anos sem acusação concreta contra ele'' e Dahr Jamail: ''Não levarão Tareq Aziz ao Tribunal: vão deixá-lo morrer na prisão''.

Matéria publicada no Tunistri (
www.tunisitri.net) e no IraqSolidaridad (www.iraqsolidaridad.org)



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