terça-feira, 3 de julho de 2007

UM PAÍS DESMANTELADO


GUATEMALA
A desilusão de um povo sem perspectiva


Os relatos dos Latinautas acerca de seu quarto destino na expedição que percorre a América Latina mostram uma Guatemala descaracterizada e sem identidade, extirpada de todas suas forças de resistência e incapacitada de se libertar do domínio norte-americano.
Latinautas*




No quarto destino de nossa expedição, chegamos à Guatemala e encontramos um país devastado por anos seguidos de sistemático desmantelamento das instâncias democráticas e de direitos humanos. Para entender um pouco deste cenário desolador, recorremos a uma sinopse da História guatemalteca, que publicamos em artigo à parte, para concluir que a atual situação do país é desesperadora. Conversamos longamente com Yolanda Colóm, guerrilheira sobrevivente que nos narrou passagens terríveis da luta que se estendeu desde a segunda metade da década de 60 até o início da de 80. Esposa do escritor Mario Payeras, Yolanda juntou-se à guerrilha motivada pelo pensamento da Teologia da Libertação, pelas obras sociais do arcebispo de Olinda Dom Hélder Câmara e por manuscritos de Paulo Freyre. O relato a seguir dá conta da atual situação da Guatemala, onde ainda impera a violência contra os índios e as mulheres, onde não há esperança nem trabalho e onde o embaixador dos EUA ainda exerce imensa influência sobre as decisões do governo.Guatemala hoje. Após o período de 1966 a 1982, no qual a Guatemala teve mais desaparecidos, assassinados e presos políticos do que todos os demais países da América Latina juntos, iniciou-se um longo período de tentativas de solucionar o conflito. Somente em 1996, entretanto, foram assinados os acordos de paz.Instalou-se, então, uma democracia aristocrática. O povo pode votar, mas não pode escolher. Os candidatos são brancos, com sobrenomes alemães, austríacos, ingleses, numa população composta de mais de 70% de índios e mestiços. A violência contra os índios e contra as mulheres ainda está legitimada. Os resquícios do genocídio são claros e evidentes. Por lei, aquele que estuprar uma mulher terá o perdão de sua pena se casar com a vítima. O país está esquecido, não possui mais identidade. A resistência cultural é apenas indígena, restringindo-se ao uso de roupas e idiomas próprios. Há um movimento feminista em ascenção. Há nove anos, foi criada a revista La Cuerda, Una Mirada Feminista da Realidad, que luta pelos direitos das mulheres. Há ainda uma resistência de movimentos ecológicos, que lutam contra a privatização de áreas de preservação ambiental e que são criticados pela imprensa que os consideram obstáculos para o desenvolvimento do país. O movimento campesino já não possui as mesmas forças, não há organização e ocorrem manifestações esporádicas. A desilusão encontra-se ligada à situação econômica e social do país. Indices de pobreza e miséria que se comparam aos do Haiti marcam este país que é sinônimo de desesperança e condições de desumanidade.A principal fonte de renda hoje na Guatemala não é mais a banana nem o café. São os imigrantes, ilegais, que trabalham nos EUA e que geram as riquezas desta Nação. Enquanto isso, o embaixador dos EUA na Guatemala está nas colunas sociais. Tem mais poder que o presidente da República em diversos temas do país. Aponta diretrizes econômicas, taxas de juros, políticas sociais. Apoia publicamente as repressões aos movimentos de resistência. E quem ousar derrubar, ou simplesmente ameaçar este sistema, será punido pela democracia ianque.


(*) Latinautas é o apelido dado pela Carta Maior à equipe da expedição "Da América para as Américas", formada por Milena Costa de Souza, Pedro José Sorroche Vieira, Thiago Costa de Souza e Ligia Cavagnari. Eles atravessam as américas, passando por 17 países, percorrendo mais de 25 mil km em busca de uma identidade de resistência à hegemonia política, econômica e cultural exercida pelos EUA.

Leia o especial LATINAUTAS, com a íntegra dos relatos e comentários sobre a expedição "Da América para as Américas". (Leia aqui)


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