“Sei do perigo de cobrir uma guerra, mas, mesmo assim, gostaria de voltar e terminar o meu trabalho. É muito interessante”
Em um dia foi informado que poderia ir cobrir a guerra no Iraque, duas semanas depois já estava com a mala pronta e um equipamento de 80 mil dólares sob sua responsabilidade.
O jornalista da TV Bandeirantes Herbert Moraes, primeiro goiano a cobrir uma guerra, ou uma “pré-guerra”, conta em entrevista exclusiva para o Jornal Opção todos os detalhes sobre como é o Iraque sob um foco nada sensacionalista, e, sim, humanista.
Herbert traça o perfil da sociedade iraquiana, seus costumes, curiosidades e fala sobre fatos que o marcaram.
Como foi repórter e cinegrafista ao mesmo tempo, além de fotógrafo, Herbert Moraes retrata uma Bagdá com a riqueza de detalhes da informação narrada pelo povo e documentada por suas lentes.
Nas imagens apresentadas a seguir, Herbert conseguiu documentar lugares proibidos de serem fotografados e que se há 30 dias existiam, hoje, quatro dias do início da guerra, já estão todos destruídos.
Euler Belém — Como foi decidido que você iria para o Iraque?
Eu estava na redação, quando o então diretor executivo da Band, Carlos Amorim perguntou, na redação, quem falava bem inglês.
Disseram que eu falava.
Ele, então, me chamou e perguntou como estava o meu inglês.
Falei que estava bom.
Ele disse para eu preparar a documentação e a minha mala que eu iria para o Iraque.
Eles pediram o meu passaporte e uma semana depois voltaram a me chamar.
Foi quando disseram que dentro de quatro dias eu iria para o Iraque.
Estudei muito sobre o Oriente Médio antes de ir.
Euler Belém — Qual é a rota para chegar ao Iraque?
Depende.
O normal seria São Paulo–Amsterdã, Amsterdã–Amã na Jordânia, depois para Bagdá.
O problema no meu caso foi quando cheguei em Damasco, Síria.
O espaço aéreo estava fechado no Iraque, então, tive de pegar um ônibus para Bagdá.
A viagem durou quatorze horas.
Euler Belém — Quantos quilômetros?
São mil quilômetros no deserto.
Euler Belém — Qual era o ônibus?
Uma marinete, o mesmo que aquelas jardineiras antigas.
Era um ônibus velho, sem banheiro.
O vidro da frente estava quebrado e entrava um poeirão terrível.
Euler Belém — Tem militares na estrada?
Tem e eles checam tudo.
Como eu estava com o pessoal da Federação das entidades árabes, e eles eram convidados do governo iraquiano, não tive problema.
Euler Belém — Você foi a convite do governo iraquiano?
A Band não, mas, nos quatro primeiros dias, estive acompanhado de um grupo que estava a convite do governo do Iraque.
Por isso, tivemos algumas regalias.
Por exemplo: quando entrei na Síria, tive problema com o equipamento, já no Iraque, não.
Na saída, tive problemas, porque não estava mais com o grupo.
Quase que não consigo voltar.
Patrícia Moraes — O seu equipamento foi apreendido?
Foi apreendido na Síria.
A Síria tem um problema sério com Israel por causa das Colinas de Golan.
Israel tomou as Colinas de Golan da Síria.
Não chega a ser uma guerra, mas é um problema militar.
Por isso, eles desconfiam muito de quem entra com equipamento.
Na Síria, não pude usar o meu equipamento.
Euler Belém — A estrada entre Síria e Bagdá tem restaurante?
Somente depois de ter entrado no Iraque a gente parou num posto militar que tinha um restaurante e havia um pessoal preparando carneiro.
Ofereceram carneiro, mas o grupo que estava comigo e eu não aceitamos.
Estava muito frio, eram umas seis horas da manhã.
Tomamos um chá e comemos pão sírio, que eles fazem na hora, com queijo.
Euler Belém — Como era sua alimentação no Iraque?
Comida árabe.
Eles fazem um arroz-de-carreteiro muito bom.
Euler Belém — Arroz-de-carreteiro com carneiro?
Com carneiro, tabule e homus.
Eles comem muito pepino.
No café-da-manhã eles comem tomate, pepino, azeitona, homus. [pasta de sementes de grão-de-bico]
Euler Belém — Na Síria, como eles analisam a situação entre Iraque e Estados Unidos?
A Síria tem uma relação muito boa com o Iraque.
Ambos são governos ditatoriais.
É normal para eles passarem o poder de pai para filho.
Eu não acredito que essa invasão americana vá provocar um movimento do povo contra Saddam Hussein.
Euler Belém — Quais são as conseqüências do embargo econômico na sociedade iraquiana?
O abastecimento alimentar é contornado com os países vizinhos.
Tanto na Síria como no Iraque não há Coca-Cola.
Eles tomam uma bebida parecida com Pepsi que é produzida no Irã.
Refrigerantes vêm do Irã, arroz do Vietnã e açúcar do Brasil.
O mercado negro é muito grande e sem nenhum tipo de controle do governo.
Há muita mercadoria da China, Taiwan e Irã.
Mesmo tentando contornar as dificuldades provocadas pelo embargo, o Iraque tem 1 milhão de famintos.
Euler Belém — A vida em Bagdá é muito cara?
Muito cara.
O dinar iraquiano não vale nada.
Por exemplo, 1 dólar corresponde a 8 notas de 250 dinares, isto é, 2 mil dinares.
Com 2 mil dinares se consegue comer bem em Bagdá.
Com 10 dólares pode se comer um banquete no restaurante mais caro.
Eu entrevistei um garçom que ganha um dólar por dia e estava muito feliz.
O recepcionista do hotel onde eu estava hospedado ganha 75 dólares por mês, que é muito no Iraque.
Euler Belém — Água é importada?
A água de garrafa é do Irã.
O grupo que ficou comigo durante quatro dias tomou água da torneira do hotel e teve diarréia.
Patrícia Moraes — Como é o sistema de saúde?
O Hospital Central de Criança Saddam Hussein já foi referência no mediterrâneo e, hoje, não tem mais nem equipamentos, tudo está sucateado.
Não há nem mesmo antibióticos básicos. Quem tem leucemia está condenado a morte, por exemplo.
Euler Belém — Você falou que o iraquiano está pronto para a guerra, e que respeita muito Saddam Hussein.
Qual é a explicação?
Um pouco é resultado da repressão, e a outra explicação é a lealdade e a admiração por Saddam Hussein.
O fato de ele ter sido soldado e, hoje, ser um líder faz com que tenha respeito na sociedade.
Euler Belém — Existe oposição a Saddam Hussein?
Existe uma oposição, mas bem camuflada.
Euler Belém — Se os Estados Unidos conseguirem derrubar Saddam Hussein vão conseguir implantar um novo governo?
Não. Se Saddam Hussein cair, quem vai governar é Frank Tomy, que é o senhor dos anéis.
É impossível implantar uma democracia onde existem tribos.
Os curdos, os sunitas, os xiitas possuem estilo de vida diferente.
Patrícia Moraes — A ditadura Saddam Hussein oferece condições de vida para a sociedade?
Oferece.
Não existe analfabetismo no Iraque, são 6 milhões de crianças estudando.
Patrícia Moraes — Mas a saúde é precária.
A saúde é precária, porque existe o embargo, mas todos têm acesso aos hospitais, e, antes do embargo, o governo dava tudo para os iraquianos em termos de saúde. As universidades são públicas ou particulares. Eu fui a uma universidade de economia, onde os alunos pagam 100 dólares por ano. Todos os iraquianos querem trabalhar para o governo.
Patrícia Moraes — Há muita diferença social?
Tem classe alta, média e baixa.
O bairro mais miserável de Bagdá é habitado por curdos que são contra o regime de Saddam.
Lá, a miséria é como em São Paulo.
Não há saneamento, recolhimento de lixo.
O governo abandonou a população.
As pessoas ricas trabalham para o governo.
Euler Belém — Você chegou a conversar com algum opositor ao regime de Saddam Hussein?
Conversei com um homem, na feira, que não concordava com o governo Saddam.
Foi a única pessoa entre as centenas que eu conversei que falou mal do governo Saddam.
Disse que, apesar de não gostar, tinha que abaixar a cabeça, porque mora ali e trabalha para o governo.
Ele também disse que não podia falar mal do governo Saddam dentro da casa dele para os filhos. E quando fala do governo é para a mulher, trancados no quarto, e muito baixo.
Euler Belém — Como você se comunicava com as pessoas?
Eu tinha um guia que trabalhava para o Ministério das Relações Exteriores.
Tudo o que ele me dizia era filtrado.
Era de acordo com o que ele achava que eu podia saber.
Em Bagdá, os jornalistas são obrigados a sair com guia.
Uma vez eu fui fazer uma reportagem junto com um jornalista português.
O tema era a saída dos iraquianos de Bagdá.
Fomos a uma empresa de ônibus internacionais que fazia Bagdá–Damasco, Bagdá–Amã.
Quando estávamos entrevistando o dono de uma loja, o guia do jornalista português, que era uma pessoa medrosa, disse que ninguém estava deixando Bagdá.
Eu percebi que a tradução não tinha sido verídica e fui dar uma volta, foi quando conversei com um funcionário da mesma loja.
Perguntei como estava o negócio e ele falou que o número de pessoas viajando tinha aumentado por causa da guerra.
Euler Belém — Para onde os curdos vão?
Para a Síria, Jordânia.
Euler Belém — Você notou tensão e medo nas pessoas?
Muito disfarçado.
As pessoas estavam seguindo com a vida normalmente, mas por causa do governo.
A imagem que aparece das crianças jogando bola foi colocada na televisão pelo governo, que não revelou o limite de 48 horas estipulado pelos Estados Unidos para o início da guerra.
O governo maquia muito.
Euler Belém — A televisão estatal controla tudo?
Tudo.
São três canais que a toda hora passam clipes horrorosos do Saddam Hussein e músicas em sua homenagem.
As mensagens são passadas exaustivamente na televisão.
Há dois anos que ele não aparece em público.
Patrícia Moraes — Que característica da sociedade pareceu mais interessante para você?
Várias.
As mulheres são gordas e os casamentos são muito interessantes.
Os noivos não participam da festa de casamento.
Eles chegam depois com a família.
Os homens não participam desse ritual.
Participam da festa as mulheres de ambas as famílias que são as mães, irmãs, a tia da tia, a cunhada da cunhada.
É a família inteira mesmo.
Elas vão para a porta do elevador e começam a cantar, representando a hora do acasalamento.
O noivo sobe em um elevador com a família dele e ela sobe em outro elevador com a família dela. Eles chegam ao andar das núpcias e as famílias acompanham os noivos até a porta do quarto.
A noiva chora, se despedem e a família volta para a festa.
Patrícia Moraes — Vestida de branco?
Vestida de branco, de véu e grinalda.
Patrícia Moraes — Muitas jóias?
Muitas pedras preciosas e muita maquiagem.
As mãos também são pintadas.
Euler Belém — Os homens também são gordos?
São e todos usam bigode.
Fumam muito, exageradamente.
Euler Belém — Cigarro ou cachimbo?
Cigarro.
É estranho quem não fuma.
Não fumar e não ter filhos é estranho no Iraque.
No elevador, tem cinzeiro.
Outra coisa muito interessante aconteceu quando fui de Bagdá para Damasco.
Eu estava no avião de uma empresa iraquiana, quando, de repente, o piloto que estava taxiando na pista começou a rezar.
Depois, todos começaram a fumar.
Euler Belém — Você não ficou sufocado?
Na hora eu chamei a aeromoça e perguntei se as pessoas podiam fumar.
Ela disse que sim.
As mulheres não fumam, mas todos os homens fumam.
Euler Belém — As pessoas se paqueram?
Eles não são como no Irã ou no Afeganistão.
Não são tão radicais com a religião.
Nem todas as mulheres usam véu.
Depende da tribo.
Os xiitas admitem que elas usem véu, mas não precisam usar burca;
as sunitas podem usar maquiagem e não precisam usar véu.
Euler Belém — Tem prostituição?
Tem, mas muito disfarçada na Rua Arassat, a mais chique de Bagdá.
Onde estão os bons restaurantes e lojas.
Euler Belém — A riqueza é ostensiva?
Os prédios, as construções?
Não.
A riqueza é vista somente nos Palácios de Saddam Hussein.
Euler Belém — As companhias de petróleo são todas do governo?
São todas estatais.
Tem algumas companhias estatais que possuem acordos comerciais com França, Rússia.
Euler Belém — Você não tem medo de cobrir guerra?
Não tive medo nenhum.
No primeiro dia, quando peguei o ônibus de Damasco para Bagdá, tive um pouco de medo. Durante as 14 horas de viagem, o motorista deu carona para uma família com cinco filhos, um iraquiano e a mulher.
E para dois tunisianos que estavam indo para Bagdá fazer parte de um protesto pró-Iraque.
No meio do caminho, eu tomei um Dramin para dormir.
Eu nunca tinha tomado Dramim e apaguei.
Atrás do ônibus tinha um banco grande que a gente revezava, porque dava para deitar.
Na minha vez, como eu tinha tomado Draminm, dormi e não acordei mais.
O pessoal ficou nervoso comigo, porque não tinha cristo que me levantasse.
Numa determinada hora da viagem o ônibus parou numa barricada, todos desceram e eu continuei dormindo.
Alguém pediu para que o tunisiano me acordasse.
Ele era escuro, grandão, vestia um casaco preto e usava bigode.
Ele foi me acordar sacudindo e falando árabe.
Eu só via esse homem falando árabe comigo, de casaco preto, com cara de árabe.
O ônibus vazio, pensei: bom, mataram todo mundo e só faltou eu.
Me descobriram aqui no canto e agora sou eu.
Nesse momento, alguém lá fora me chamou: “Herbert desce daí”.
Foi quando eu me acalmei. [Risos]
Euler Belém — Você gritou?
Não, fiquei olhando, parado.
Ainda estava sob o efeito do remédio.
Esse foi o único medo que passei.
Euler Belém — Você ainda pode voltar para o Iraque. Agora não é mais arriscado?
É. Eu não voltaria para o Iraque, porque, como não há serviço de embaixada, não há ninguém para autorizar a entrada no país.
Agora é cada um por si.
Euler Belém — Como os jornalistas do New York Times conseguiram entrar?
Porque eles já estavam em Bagdá.
Euler Belém — Eles não saem também?
Se quiserem, podem sair.
Euler Belém — Onde eles ficam?
Há alguma área de menos risco?
Não.
Toda a imprensa fica no prédio do Ministério da Informação, porque ninguém pode trabalhar fora.
Embaixo do prédio existe um abrigo antiaéreo.
Esse pode ser um dos alvos. [No primeiro dia de bombardeio este prédio foi um dos primeiros alvos acertados.]
Euler Belém — Você iria para o Kuait ou para a Síria?
Iria para o Kuait.
A Síria está muito longe de Bagdá.
Patrícia Moraes — Há muitos abrigos espalhados pela cidade?
Muitos.
Euler Belém — Você acha que Saddam Hussein foge?
Ele não tem uma Al Qaeda.
O Bin Laden tem uma rede atrás dele e pode se esconder em cavernas.
Saddam Hussein não é o tipo que se esconde em caverna.
Euler Belém — Você sabe de algum grupo terrorista finlandês ligado ao Saddam?
Desconheço essa história.
Eu encontrei dois finlandeses no Iraque e achei estranho.
Na Síria, também tinha um finlandês.
Euler Belém — Qual o motivo que eles dão para a guerra?
Petróleo.
Eles odeiam os americanos.
Patrícia Moraes — Você falou de uma curiosidade da sociedade.
Agora me fala sobre alguma coisa que te surpreendeu?
As privadas.
Não tem privada, é latrina.
No banheiro tem um buraco, com um lugar para colocar os pés e é preciso abaixa para fazer as necessidades.
Euler Belém — Um mau cheiro terrível?
É.
Tem outra curiosidade.
O grupo que viajou comigo me disse que as fezes ficariam da cor de doce de leite.
Foi dito e feito.
Euler Belém — Por que acontece isso?
Por causa da comida.
Não sei o que eles usam, mas ficou parecendo doce de leite.
Eu estava no aeroporto, na Síria, quando fui usar o banheiro e vi umas fezes com a cor também de doce de leite.
O povo, realmente, tem as fezes cor de doce de leite.{risos]
Euler Belém — Como são os jornais?
Tem um jornal para estrangeiros, o Irait Dain, que é uma porcaria.
O papel é bom, mas no canto sempre tem um pensamento de Saddam com uma foto dele.
A primeira manchete sempre é alguma coisa relacionada a Saddam.
Tem umas matérias ridículas de meia página sobre como surgiu o guarda-chuva.
Patrícia Moraes — Quanto da sociedade fala inglês?
Muito pouco e eles falam um inglês macarrônico.
Somente quem trabalha no alto escalão do governo fala inglês.
Mas, nas escolas, têm aulas de espanhol e de inglês.
Euler Belém — Quais são as marcas físicas e psicológicas da guerra de 1991?
Física nenhuma, porque tudo o que foi bombardeado, foi demolido.
Por isso, há muito espaço aberto em Bagdá.
Al Meria era um abrigo para 450 crianças e mulheres.
Todos estavam lá, no dia do ataque, em 1991.
Eles preservaram o lugar como ficou naquela época.
Quando se entra, ainda é possível sentir o cheiro de queimado.
Doze anos depois, é impressionante.
Todas as 400 e tantas pessoas que estavam lá dentro morreram.
No teto do abrigo está o buraco do míssil que entrou.
Euler Belém — Há alguma possibilidade de você ter que voltar?
Toda.
Eu sou a única pessoa que tem visto na Bandeirantes para entrar no Iraque.
Euler Belém — É cara a estada no Iraque?
É.
Eu gastei 4 mil dólares em duas semanas.
O hotel é muito caro.
Eu fiquei em dois hotéis.
Em um hotel gastei 400 dólares e, no outro, 1.700 dólares.
Gastei muito com telefone, porque tinha que ligar para os guias.
Do dia 20 a 25, gastei 200 dólares por dia para poder trabalhar.
É preciso ter uma autorização do Ministério da Informação, que, na verdade, é uma forma deles tirarem dinheiro dos jornalistas.
Eles cobram 200 dólares por dia para o jornalista poder trabalhar.
No total, eram 200 dólares e mais 100 dólares para o guia indicado por eles, ou seja, esse dinheiro também vai para o ministério.
Como foram 300 dólares por dia, em cinco dias eu gastei 1.500 dólares.
Na Babilônia, também gastei muito.
Logo que cheguei, comecei a filmar quando um homem que fica vigiando me perguntou se eu tinha autorização do Ministério do Patrimônio Histórico e da Cultura, que custa 5 mil dólares.
Como eu não tinha, o guia, que estava comigo, me disse para seguir a visita sem a câmara.
Eu segui com o guia da Babilônia e o outro que mora lá ficou conversando com o meu guia. Quando voltei, o guia que me mostrou a Babilônia foi embora e o meu guia me disse que, se eu pagasse 200 dólares para o guia que mora lá, poderia filmar.
Paguei e filmei tudo, até um dos palácios de Saddam Hussein que não podem ser filmados.
Tudo em Bagdá funciona com propina.
É o “rachim”.
Euler Belém — A Babilônia está conservada?
Está bonita.
Na verdade, como tudo foi destruído e o que sobrou foi levado pelos alemães.
Saddam Hussein reconstruiu tudo.
Quando se entra na Babilônia há uma placa enorme com o perfil de Nabucodonosor [que viveu antes de Cristo] e, ao lado, o perfil de Saddam Hussein.
Ele gosta de se igualar aos grandes reis da Mesopotâmia, tanto que construiu um palácio ao lado.
Euler Belém — Não há turistas?
Desde 1991, os 1.500 turistas que visitavam a Babilônia, por dia, sumiram.
Patrícia Moraes — Você entrevistou o vice-primeiro ministro, Tarik Aziz, o que ele falou?
Perguntei para ele que opinião tinha sobre a afirmação de George W. Bush de que o Iraque seria o 54º Estado americano depois do ataque.
Ele respondeu que era um absurdo, que o povo iraquiano não iria admitir essa supremacia americana e que todos os iraquianos estavam preparados para a guerra.
Então perguntei se ele estava preparado.
Ele falou que estava e que jamais abandonaria o Iraque.
Patrícia Moraes — Você passou por algum treinamento de segurança?
Nada.
Euler Belém — Você está com vontade de voltar?
Estou, porque é muito interessante.
Mas, como tenho noção do perigo, passaria por um treinamento de segurança, como o jornalista Caco Barcelos, na Inglaterra, antes de ir.
Euler Belém — Caco Barcelos foi para o Kuait?
Marcos Uchôa está no Kuait.
Eu só iria se tivesse um aparato maior.
Eu não iria como fui dessa vez, carregando equipamento de 180 mil dólares na mão.
Euler Belém — Por que a Globo foi expulsa do Iraque?
Quem a tirou de lá?
Dizem que foi por causa da história dos guias.
Em uma das reportagens do Luiz Carlos Azenha, ele falou que, finalmente, tinha conseguido entrevistar os iraquianos para saber o que eles pensavam sobre a vida em Bagdá.
O embaixador do Iraque, na hora, ligou daqui para o Iraque e contou.
Na mesma hora, mandaram eles de volta.
Euler Belém — Como é o clima?
À noite, agora, faz muito frio, porque é inverno.
Mas, na quinta-feira, 20, começa a Primavera.
Euler Belém — Lá tem árvores?
Muitas tâmaras.
Euler Belém — Você viu alguma livraria, banca de revista?
Não.
Euler Belém — E farmácia?
Poucas .
Euler Belém — A presença militar lá é ostensiva?
É.
Não se pode fotografar nada.
No dia que eu fotografei o prédio com a imagem de Saddam o policial quis tomar a minha câmera.
Euler Belém — Com fuzil na mão?
Fuzil na mão.
Euler Belém — Fuzil novo?
Não, velho. Tudo sucateado
Patrícia Moraes — Como é o povo iraquiano?
São amigáveis, inteligentes e interessados.
Euler Belém — Não perguntaram se você era jogador de futebol?
Toda hora eles falavam Ronaldo, Ronaldinho.
Patrícia Moraes — Há boates, bares para sair à noite?
Não.
O estádio de futebol funciona todos os dias com jogos ou shows de música.
Eles prezam muito a família.
Euler Belém — Há droga?
Quem usa droga é condenado à morte.
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