quinta-feira, 4 de outubro de 2007

PRESIDENTE SADDAM E O TRIBUNAL FANTOCHE



Redacción 20 de outubro 2005

O presidente deposto do Iraque Saddam Hussein negou-se a responder às perguntas feitas pelo juiz e também negou-se a reconhecer a legitimidade do Tribunal Especial Iraquiano (TEI), formado pelo governo fantoche do país.

Hussein foi levado ao "tribunal" ontem (19) em Bagdá, sob a acusação de que teria ordenado o massacre de 143 xiitas em 1982.

"Reivindico o direito constitucional de fazer valer meus direitos de chefe de Estado e me recuso a responder", disse, dirigindo-se ao presidente do tribunal.

"Não reconheço sua autoridade porque todo (este tribunal) carece de fundamento", acrescentou.

O ex-vice-presidente Taha Yassine Ramadan, vestido com uma túnica branca, também não quis dar sua identidade, limitando-se a dizer que sua "identidade fora roubada".

Acrescentou que confirmava "o que o presidente Saddam Hussein disse".

Redes de TV iraquianas mostraram imagens do início do julgamento e do presidente do tribunal, o curdo Rizgar Mohamed Amin , que lia um documento.

"Esta é a primeira audiência, do primeiro caso, Dujail", disse o presidente do tribunal, antes de chamar os oito acusados.

Hussein estava sentado e rodeado por uma cerca de 1,5m de altura.

Todos podem ser condenados à pena de morte.

Farsa

A filha mais velha de Hussein, Raghad, criticou desde Amã, na Jordânia, onde está exilada, a farsa do julgamento, informou um membro do comitê de defesa.

"Raghad está aborrecida com o modo como o julgamento é realizado, principalmente com a ausência dos advogados solicitados por seu pai", disse em Amã (Jordânia) o advogado jordaniano Issam Ghazzawi, referindo-se ao comitê de defesa, que inclui letrados árabes e estrangeiros, entre eles o ex-secretário de Justiça americano Ramsey Clark.

O conjunto de advogados não foi escolhido por Hussein, tampouco pôde conversar com o acusado livremente, como o exigido pelas convenções internacionais.

Apenas o advogado iraquiano Khalil al Dulaimi foi autorizado pelo governo fantoche e pelas forças de ocupação a defender o presidente deposto.

Entre as acusações contra os oito réus estão as de "assassinato, expulsão, prisão, tortura e desrespeito às normas internacionais".

Durante a sessão, Hussein observou a troca de argumentos entre acusação, defesa e o presidente do tribunal, sem fazer intervenções.

Após uma breve audiência, o juiz adiou a sessão e marcou a próxima audiência para 28 de novembro próximo.

Al Dulaimi havia pedido um adiamento por três meses, mas o juiz optou por pouco mais de um mês.

Tensão

A tensão era sentida em todo o país com o início do julgamento, dois anos após Hussein ter sido capturado pelas tropas americanas, em 2003.

Em Tikrit, cidade natal do ex-presidente e de quase toda sua família, a tensão era mais evidente.

Dezenas de pessoas concentraram-se em um estádio da cidade para protestar contra o julgamento.

No Iraque, as reações ao início do "julgamento" do ex-presidente foram variadas.

A mídia ocidental procurou exibir imagens de muçulmanos xiitas e curdos se manifestando a favor de penas duras contra Hussein.

A imprensa colaboracionista, dirigida por antigos adversários do governo de Hussein, colocou o "julgamento" em suas manchetes.

"Julgamento de um tirano" e "Primeiro ditador árabe a ser julgado" estampavam alguns jornais.

Na imprensa da comunidade sunita, o julgamento foi mencionado, sem grandes artigos.

Em nenhuma outra parte o contraste foi tão marcante quanto nos distritos bagdalis de Azamiyah, de maioria sunita, e Kazimiyah, de população xiita, separados apenas pelo Rio Tigre.

Apenas um fator unia as duas populações: a precária rede elétrica de Bagdá.

A energia falhou diversas vezes durante a transmissão do julgamento.

Na televisão, as grandes redes se preocuparam em mostrar os sentimentos dos oposicionistas e silenciaram em relação às grandes manifestações em Tikrit, Bagdá e Faluja, a favor de Hussein.

Uma seqüência veiculada pela CNN mostra uma dona-de-casa xiita cuspindo na tela da televisão ao ver a imagem de Hussein.

Quando o juiz se dirigiu ao ex-presidente como "senhor Saddam", ela gritou: "Monstro Saddam, você quer dizer!"

Do outro lado do Rio Tigre, num bairro de maioria sunita — a mesma confissão de Hussein — alguns moradores também ficaram galvanizados pelas imagens na TV.

Namir Sharif, ex-oficial do Exército, quase chorou de orgulho ao ver Hussein desafiar a autoridade do tribunal.

"É um ato heróico", disse.

Alguns iraquianos assistiram à primeira sessão do tribunal com temor ou ódio, outros com alegria, outros ainda com amargura e até uma certa nostalgia.

Mas todos assistiram com atenção, incapazes de desviar os olhos da imagem do antigo líder, antes senhor supremo do Iraque, agora réu em julgamento.

Palestinos querem Bush lá

Para os palestinos, Hussein é mais vítima do que algoz, um alvo direto do imperialismo americano.

Para os israelenses, o presidente iraquiano deposto é uma figura demoníaca. Os dois lados têm visões opostas do julgamento de Saddam.

Os palestinos acreditam que o ex-presidente é vítima de uma injustiça; os israelenses esperam que o julgamento sirva de alerta a outros déspotas do Oriente Médio.

Osama Shagnobi, um morador de Gaza, lembra dos cerca de US$ 21.000 que sua família recebeu do governo iraquiano por causa da morte do irmão, Mohammed, num choque com soldados israelenses.

"Não é possível comparar a vida do meu irmão com dinheiro nenhum no mundo, mas sentimos que Hussein estava entre as poucas pessoas ao nosso lado e mostrou que alguém se importava com a perda que sofremos", disse Shagnobi.

Por intermédio de organizações assistenciais islâmicas, o regime de Saddam enviava regularmente dinheiro a parentes de homens-bomba e de extremistas mortos em combates com Israel.

Os palestinos também reverenciaram Saddam quando ele disparou 39 mísseis Scud na direção de Israel durante a Guerra do Golfo, travada em 1991.

Os disparos causaram danos consideráveis, mas poucas vítimas.

Já os israelenses têm uma posição totalmente diferente, algo bastante esperado.

Para eles, o julgamento de Saddam é visto como um "evento que obrigará líderes árabes" a perceber que poderão "pagar por seus atos", repercutindo a opinião da mídia oficial americana e israelense.

"Hoje é um dia especial, pois um terremoto atinge o mundo árabe, com líderes pagando por seus crimes", vituperou o ministro israelense das Relações Exteriores, Silvan Shalom, em entrevista à Rádio Israel.

Em Jerusalém, o israelense Bibi Nissin, de 51 anos, disse acreditar que Saddam terá um julgamento "justo".

"Espero que ele seja condenado à prisão perpétua. E não me importa onde ele cumprirá a sentença, já que não estará aqui em Israel."

Muitos palestinos, revoltados com o favorecimento americano a Israel e com a ocupação do Iraque, gostariam que o presidente dos EUA, George W. Bush, fosse julgado junto com Hussein.

"Se ele é um assassino, o que poderíamos falar dos atos americanos cometidos no Iraque?", questionou o motorista de taxi Saed Souror, de 32 anos.

"Para existir justiça, Bush e Saddam deveriam ser levados ao banco dos réus juntos."

Veja abaixo parte da transcrição do início do "julgamento":

Hussein: Aqueles que lutaram pela causa de Deus serão vitoriosos... estou à mercê de Deus, o mais poderoso.

Amin (juiz 'responsável'): Senhor Saddam, por favor, nos diga sua identidade, seu nome... Você tem bastante tempo, você terá tempo suficiente para dizer o que quiser e expressar seus pensamentos. Mas esta corte tem um procedimento e nós temos que segui-lo.

Hussein: Quem são vocês? O que vocês estão fazendo aqui? Eu não respondo a esta "chamada" corte, com todo o respeito. E me reservo o direito constitucional como Presidente do Iraque (...) Eu não reconheço nem a entidade que autoriza vocês, nem a agressão, porque tudo baseado em falsidade é falsidade... Você já foi juiz antes?

Amin: Não há espaço para este tipo de conversa neste tribunal.

Hussein: Estou neste tribunal militar desde as 2h30 da madrugada, e usando a mesma roupa desde as 9h. Você me conhece, você é iraquiano e sabe muito bem que eu não fico cansado.

Amin : Estou aqui para perguntar sobre sua identidade.

Hussein: Eu respondi essa pergunta por escrito e a enviei a você.

Amin: Senhor Saddam, vá em frente. Você é culpado ou inocente?

Hussein: Eu disse o que disse, eu não sou culpado, sou inocente.

Com agências internacionais

Nova publicada no Diário Vermelho .

http://www.arroutadanoticias.com/novas/nova201020054.html

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