Fragmentos da morte
Por Katherine Stapp*
Uma campanha global procura deter o uso de bombas de fragmentação.
As 57 nações que as armazenam são contrárias a uma moratória.
Nova York – Cresce a pressão internacional contra o uso das chamadas bombas de fragmentação, ou de dispersão, que espalham centenas de estilhaços letais e são responsáveis pela morte de milhares de civis.
Mas os governos que as armazenam se fazem de surdos.
“A guerra no Iraque agravou a necessidade de atuar contra essas armas, já que mais de mil iraquianos foram feridos ou mortos por estilhaços durante o bombardeio de seu país”, disse ao Terramérica Virgil Wiebe, assessor legal do Comitê Central Menonita, um dos grupos mais ativos a favor da moratória.
“É cada vez mais claro que alguns tipos de bombas de dispersão simplesmente deveriam ser proibidos. É muito comum não explodirem e criarem pequenos campos minados que farão muitas vítimas”, acrescentou.
Em novembro, a Coalizão das Munições de Dispersão, formada por 85 organizações não-governamentais de 42 países, se reuniu na cidade holandesa de Haia para pedir uma moratória da produção, do comércio e uso dessas armas, “até que seus problemas humanitários estejam resolvidos”.
Entre os integrantes dessa coalizão estão a Anistia Internacional, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e a Human Rights Watch.
Esta reunião coincidiu, deliberadamente, com outra, em Genebra, da “Convenção sobre proibições ou restrições do emprego de certas armas convencionais que possam ser consideradas excessivamente nocivas ou de efeitos indiscriminados”, de 1980. Um novo quinto protocolo dessa Convenção foi aprovado, em Genebra, sobre alguns efeitos imediatos das bombas de dispersão, mas, não se refere ao seu uso em geral nem aos alvos aos quais possam ser dirigidas.
Até agora, somente a Suécia ratificou esse protocolo e nenhum país apóia a moratória.
Pelo menos 57 nações armazenam bombas desse tipo, especialmente Estados Unidos, Rússia e China.
Entre as bombas de dispersão mais perigosas estão a Munição de Efeitos Combinados BLU-97, muito usada no Iraque e Afeganistão pela Força Aérea norte-americana, e a Munição Convencional Melhorada de Duplo Propósito (DPICM, sigla em inglês), utilizada pelo exército dos EUA no Iraque, explicou Wiebe, do Comitê Central Menonita.
Os efeitos dessas bombas foram detalhados em um relatório da Human Rights Watch, divulgado em dezembro de 2003.
Segundo o documento, foram causadas mais vítimas civis do que qualquer outro fator durante a invasão do Iraque liderada pelos Estados Unidos, em março e abril desse ano. Washington “não deu uma resposta oficial ao nosso relatório”, disse o pesquisador Mark Hiznay, da divisão de armas dessa ONG.
“Pressionamos o congresso para que enfrente a questão ao examinar a proposta presidencial de orçamento para 2005 e negue financiamento para a produção de bombas de dispersão”, acrescentou.
Um dos principais perigos dessas bombas é que os estilhaços que se espalham sem estourar podem ser recolhidos por civis que, freqüentemente, são crianças.
Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, as crianças feridas no Iraque por explosões tardias foram mais de mil desde o fim da invasão.
A ONG britânica Contagem de Cadáveres no Iraque (IBC, sigla em inglês) documentou pelo menos 200 mortes de civis nesse país causadas por bombas de dispersão, embora o chefe do Estado Maior Conjunto norte-americano, general Richard Myers, tenha garantido em abril que havia “apenas um caso registrado como conseqüência devido a bombas de dispersão”.
No dia 31 de março de 2003, um ataque norte-americano com essas bombas contra a cidade de Al Hilla, no centro do Iraque, deixou saldo de, pelo menos, 33 civis mortos e outros 109 feridos.
“É uma vergonha terrível que apenas uns poucos parlamentares britânicos defendam, de vez em quando, a proibição das bombas de dispersão”, disse ao Terramérica o porta-voz do IBC, John Sloboda, que destacou a necessidade dos meios de comunicação darem maior atenção ao problema.
Equipes militares e do Departamento de Estado dos Estados Unidos retiram estilhaços não detonadas de algumas zonas do Iraque e garantem que procuram alertar a população sobre elas com cartazes e palestras em escolas, além de conselhos locais.
Washington e Londres alegam que essas bombas são armas de guerra legítimas, e nos últimos anos foi desenvolvida uma nova geração que, segundo dizem, é muito mais certeira, com efeitos tardios inferiores a 1% dos casos.
Douglas Karas, porta-voz do Pentágono (Ministério da Defesa dos EUA) garantiu ao Terramérica que a Força Aérea de seu país usou no Iraque bombas de dispersão “muito certeiras”, projetadas para “funcionar contra alvos previstos” e não espalhar munições caso não os atingissem.
Outras perguntas sobre vítimas civis e a proposta de moratória não foram respondidas por Karas nem por outros funcionários do Pentágono consultados.
* A autora é colaboradora do Terramérica.
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